Capítulo
2-
“Há algo de podre no reino da Dinamarca.” William
Shakespeare.
Londres;
Greewich; Domingo; 12:08;
Mel
estava sentada na sala, vendo “Como se fosse a primeira vez” com Chay,
quandoSophia abriu a porta do apartamento, com os olhos arregalados e leves
olheiras.
-
Passou a noite com o Ethan? – perguntou sem desviar os olhos da tela, colocando
uma mão cheia de pipoca na boca.
-
Passei. – a amiga respondeu com a voz baixa. Chay desviou seu olhar do
filme por um segundo, para olhar a menina.
-
Que cara é essa, Sop? – perguntou juntando as sobrancelhas. Mel
olhou-a preocupada com o comentário do namorado. Estava pálida, e seus
movimentos mais lentos. – Parece até que viu um fantasma.
-
Talvez eu tenha visto. – se jogou sentada numa cadeira marrom, do lado do
sofá.
-
O que quer dizer?
-
O que eu quero dizer, Melzinha, é que eu a vi. – disse
pausadamente. Os outros dois perderam completamente a atenção na televisão com
a frase.
-
Você sabe que isso é impossível. – a voz de Mel falhou.
-
Desde ontem eu não sei de mais nada. – soltou um suspiro pesado.
-
Onde você a viu? – Chay se manifestou.
-
Na porta do Mark’s.
-
Não devia ser ela. Com certeza não era. – a garota sentiu um nó na
garganta, ao relembrar. O namorado abraçou-a pelos ombros.
-
Eu tenho certeza, Melzinha. – Sophia balançou a cabeça pros lados. –
Só podia ser...
Londres;
Dockland; Domingo; 1:03 da tarde;
-
Alô? – Thur disse sentado na cama, com o celular na mão. Seus braços
tremiam levemente, e não tinha conseguido pregar os olhos aquela noite.
O
cachorro Spike estava em cima da cama, olhando curioso as reações do
dono.
-
Porra, dude. – Duan disse do outro lado da linha, como se estivesse sendo
acordado pelo rapaz. – Já é a terceira vez que você liga essa manhã, desse
jeito vai queimar meu filme com as garotas.
-
Eu não ligo pras garotas com quem você está ou não. – respondeu sério.
-
Então o que infernos você quer a essa hora da madrugada? – resmungou.
-
Tem o telefone do Marques?
- Marques?
– pensou por alguns segundos. – Quê? Aquele perdedor da turma D?
-
Você tem ou não? – matinha a voz dura.
-
Lógico que não, Aguiar. Pirou? – deu uma risada um tanto irônica do outro
lado da linha. – Não acredito que você me ligou a essa hora pra pedir o
telefone de um cara. Você está mal mesmo, hein? Mas eu sei como resolver o seu
problema. Hoje mesmo a Brittany aparece por aí.
-
À merda com a Brittany. – irritou-se, passando a mão pelos cabelos. – Eu não
estou com saco pra ela. Quero o telefone do Marques. Só.
-
Mais gay a cada dia que passa. – Duan revirou os olhos.
-
Que seja. Tchau, dude.
-
Fica com Deus, margarida. Olha lá o que vai fazer, hein? – Thur desligou o
celular, colocando-o no criado-mudo e caindo deitado de barriga pra cima,
focando o teto.
Onde
ela estaria, e mais importante, quem era ela?
Londres;
Oxford Street; Segunda-feira; 6:30 da manhã;
Rod
tinha passado a noite inteira inquieto. Aquela segunda era o primeiro dia de
aula na polêmica Highgate High School. Não que já não estivesse acostumado com
as polêmicas e os mistérios, mas naquele ano em especial, ele tinha Lua. E
ter a prima consigo só podia significar uma coisa: Problemas. Mas o
que poderia fazer? Mandá-la desistir do sonho de estudar na Inglaterra e voltar
pro Brasil? Não seria viável. Ainda mais, com que explicação?
Tratou
de acordar cedo pra ter uma conversa com o pai, a respeito daquilo.
-
E se ela arrumar confusão lá pai? O que eu vou dizer pra tia? – perguntava
preocupado, andando de um lado para o outro na cozinha.
-
A questão é que ela já está aqui, Rod. – o pai disse sentado à mesa de
madeira, com os braços cruzados.
-
Mas o que eu devo fazer? Eu não a quero perto daquele cara. – coçou o braço com
o nervosismo.
-
Ninguém tem certeza se ele realmente foi o culpado. Pode ter sido qualquer um.
Você vai privá-la de conhecer outras pessoas? – arqueou uma sobrancelha.
-
Não. A Luinha não merece isso. – soltou um suspiro pesado.
-
De qualquer forma, filho, quero que mantenha os olhos nela. Ok?
-
Claro. Vou manter os dudes em alerta também. A história não vai se
repetir.
Londres;
Civic prateado; Segunda-feira; 7:46 da manhã;
-
Ai, que emoção. – Lua disse em português, alargando o sorriso de frente
pra uma câmera de vídeo. – Meu primeiro dia de aula na Inglaterra, isso não é
emocionante?
-
Você sabe que eu não entendo nada do que está falando, certo? – Rod disse
rindo baixo, olhando rapidamente pra prima. Estava dirigindo, e ela, no banco
do carona.
-
Aham. – acompanhou a risada baixa do garoto. – Você deveria aprender a falar
algumas palavras em português também.
-
As que eu sei já são o suficiente: ‘Oi’, ‘Tchau’, ‘Obrigado’ e ‘Te amo, tia’. –
ela gargalhou.
-
Esperto você. – disse olhando pra fora do vidro, e vendo as imagens passarem rapidamente.
Passaram
por várias casas e bibliotecas, até que seu olhar parou em um determinado lado:
A grande e magnífica Highgate High School.
Ocupava
todo o quarteirão, e era constituída por dois prédios grandes: Um de três
andares, o principal, e o outro que seria o ginásio poliesportivo.
Lua
observava e filmava empolgada os alunos uniformizados: As meninas com uma saia
plissada vermelha três dedos acima do joelho, blusa social branca e uma gravata
da mesma cor da saia. Os meninos da mesma forma, mas com a calça social
preta.
‘Nem
parece que são quem são.’ Rod pensou.
-
Todo mundo vestido igual. – ela disse maravilhada, apesar de estar vestida do
mesmo jeito.
-
Bem vinda à escola da elite. – balançou os ombros de leve. – Vamos parar o
carro ali. – apontou com as sobrancelhas, já manobrando pra estacionar junto
com os demais.
Quando
por fim desligou o automóvel, Rod saiu do Civic, contornando-o e abrindo a
porta pra prima, que filmava tudo.
-
Vamos, Luinha. Acho que não quer chegar atrasada... – coçou a nuca, dando
uma olhada rápida nas pessoas em volta.
-
Não mesmo. – desligou a máquina e colocou-a dentro da mochila verde-limão.
Desabotoou o cinto e saiu do carro, enquanto o primo segurava a porta. Rod
fechou-a ágil, já se colocando do lado da menina e passando novamente os olhos
pelos alunos, como se fosse um corvo.
-
Wow. – Scott, zagueiro do time de futebol, disse, escorado em sua picape azul.
– Quem é a garota? – apontou com o queixo, fazendo com que Bennet
olhasse.
-
Wow. – o grandalhão repetiu, observando boquiaberto a menina de cabelos longos
que acompanhava um branquelo da turma D. – Mas essa é a...
-
Eu também pensei que fosse. Mas não é possível. – Scott olhou pros lados,
confuso. Todas as outras pessoas pareciam olhar na mesma direção e cochichar
baixo. Marques estava incomodado, acelerando os passos da menina.
-
Impressão minha, ou todo mundo está nos olhando, Rod? – ela disse dando
uma risada baixa e encostando a cabeça no peito do primo, enquanto andavam juntos
pra entrada do colégio. A maioria dos alunos estava escorada nos carros, ou
sentada nas mesas que tinham na grama, ao lado de onde caminhavam.
-
Impressão sua, baixinha. Continue andando. – disse seco, passando os braços
pelos ombros da garota. Subiram as escadas da frente.
-
Dude, quando você arrumou mulher e não me falou? – ouviu uma voz masculina
conhecida esganiçar, por trás de si. Virou-se juntamente com ela.
-
Eu não arrumei mulher, mica. – rolou os olhos, enquanto o rapaz arqueava
as duas sobrancelhas ao olhá-la. – Essa é minha prima. Lua. – ressaltou as
duas últimas palavras, como se estivesse tentando dar um sinal pro
garoto.
- Lua?
– perguntou confuso, vendo a cara de poucos amigos de Rod e engolindo a
seco. – Ah, Lua! – encheu-se de entendimento, estendendo a mão pra ela,
que apertou-a em seguida. – Meu nome é Micael Borges, melhor amigo do
seu primo. Pode me chamar de mica. – sorriu simpático.
-
Hey, mica. – também sorriu. – Pode me chamar de Luinha.
-
Mas então... De onde mesmo que você veio? – fez sinal pra que continuassem a
andar, e assim fizeram.
-
Eu sou do Brasil. – ela dizia leve, feliz por ter conhecido uma nova pessoa,
ainda mais, tão simpática quanto ele. – Ganhei uma bolsa de estudos na
Highgate, por isso vim morar com o molengo. – balançou os ombros. mica deu
risada, fazendo o humor de Rod ficar ainda pior.
-
Brasil, cara? – disse surpreso. – Sempre sonhei em passar umas férias lá. A
comida, as praias, as mulheres... – sorriu tarado. – Não sei o que você está
fazendo aqui, na terra onde o sol mal brilha.
-
Sempre foi o meu sonho. Sabe como é, Beatles e tal. – deu de ombros.
-
Wow, então temos aqui uma amante da música?! – alargou o sorriso.
-
Com certeza.
-
Você podia nos ouvir tocar, algum dia desses. – colocou as mãos nos bolsos. O
amigo lhe olhou de rabo de olho, ainda abraçando a garota pelo lado.
-
Tocar? Vocês têm uma banda? – juntou as sobrancelhas.
-
Em formação ainda, mas... É, é uma banda.
-
Por que não me disse, Rod? – Lua voltou seu olhar pro primo, que ainda
encarava as demais pessoas no corredor largo e branco.
-
Não achei que isso importasse pra você. – deu um sorriso torto.
-
Claro que importa. Eu nem sabia que você tocava algum instrumento, ainda mais
ter uma banda. – ela sorriu leve. – Óbvio que eu quero ouvir vocês
tocarem.
-
Pra onde vão agora? – mica perguntou.
-
Secretaria. Precisamos saber qual é a sala da Luinha. Quer vir também?
– Marques convidou o amigo, que tinha parado o olhar numa direção só, por
um momento.
Sophia
estava escorada na parede, conversando com algumas outras meninas líderes de
torcida. Estava com o cabelo preso em um rabo de lado e ria de qualquer bobagem
que falavam. O garoto sentiu o coração bater mais acelerado, ao ver a
cena.
- mica?
– Rod arqueou uma sobrancelha, olhando na mesma direção que o rapaz.
-
Quê? Ah. Ir à secretaria... Não sei. Acho que preciso fazer outra coisa. –
atrapalhou-se.Marques soltou um suspiro pesado.
-
Sai dessa, cara. – bateu em seu ombro. Lua olhava-os curiosa, também
passando seus olhos por Sophia. – Você sabe que não deu certo.
-
Eu sei que foi um engano, dude. Um engano que eu preciso corrigir. – mordeu de
leve o lábio inferior. – Agora eu estou indo. Tchau, Luinha, prazer te
conhecer. E Rod... Muito boa sorte.
Luinha
sentiu um alerta em sua voz, como alguém que alertasse sobre algum perigo,
implicitamente. Sentiu a respiração falhar por um momento, e virou seu olhar na
direção de duas garotas paradas no corredor, enquanto continuava a caminhar com
o primo. A escola era realmente imensa.
-
Senhoritas Harris e White. – uma senhora branca e franzina, de óculos fundo de
garrafa, disse examinando-as de cima a baixo.
-
Senhora Paskin. – elas disseram quase juntas, dando um sorriso forçado.
-
Pensei que a norma da escola fosse saias três dedos acima do joelho, e não dois
palmos. – arqueou uma das sobrancelhas finas. As meninas se entreolharam.
-
O que podemos fazer se nossos dedos são gordos? – Kimberly fez bico.
-
O diretor vai adorar a explicação. – tirou uma caderneta e um lápis da bolsa,
começando a anotar algo.
-
Ah, qual é, senhora Paskin. Até parece que não se lembra quando tinha a nossa
idade. – Brittany Harris disse aproximando-se da mulher. – Mas eu sei de algo
que vai fazer a senhora lembrar. – tirou da bolsa cor-de-rosa uma nota de
cinqüenta libras.
-
Você não vai me comprar desse jeito, senhorita. Espero que amanhã as duas
tenham ‘afinado’ os dedos, senão estarão na detenção. – ela deu um sorriso
satisfeito, virando de costas e seguindo seu caminho, enquanto as garotas davam
o dedo, sem que ela visse.
-
Ridícula. – Brittany murmurou enquanto as atenções de Kimberly estavam pra
outro lado.
-
Ai. Meu. Deus. – disse sentindo as pernas bambearem. – Brit... Brit! – cutucou
a amiga com movimentos frenéticos repetidos.
-
O quê que é, inferno? – disse passando as duas mãos nos cabelos. Kimberly
levantou o dedo na direção de um casal que passava, fazendo o queixo de
Brittany cair e sua vista embaçar.
-
Ah não. – disse sentindo dificuldade em falar. – Mas isso não é possível. O
que...? Quem...?
-
Isso deve ser loucura da nossa cabeça. Ela não pode
estar...
-
Cala a boca, Kimberly. – a loira disse dando uma risada um pouco histérica. –
Óbvio que não é ela. Olhe a cor do cabelo.
-
É. Não é ela. – concordou nervosa. – Não pode ser...
-
Amor! Que bom te ver. – Chay disse abraçando a namorada, no corredor do
segundo andar. – Já está melhor?
-
Você fala como se não tivéssemos nos visto ontem mesmo. – riu baixo. – Estou,
sim.
-
Que bom. Eu fico muito preocupado com você... – começaram a andar. Ele
abraçando-a pelos ombros, e ela abraçando-o pela cintura.
-
Eu posso ter esquecido uma semana da minha vida. Mas de você eu nunca vou
esquecer. – sorriu de leve, encostando a cabeça em seu peito.
-
Eu entraria em depressão se isso acontecesse. – sorriu maroto.
-
Já olhou em que sala vai ficar?
-
Na D, como sempre. – ele revirou os olhos. – E você?
-
Devo ter ficado na B de novo. Mas tenho que conferir. – balançou os ombros,
observando um casal que passava ao lado deles. Sentiu as pernas tremerem e os
olhos esquentarem. O coração disparou, impulsionando-a a andar apressada atrás
dos dois.
-
Hey, Melzinha, o que você está...? – Chay perguntou, vendo a namorada
desvencilhar-se de seus braços e correr em uma determinada direção.
Uma
lágrima ameaçou sair pelos olhos de Mel, quando ela estendeu as mãos
trêmulas e puxou a garota de cabelos longos e escuros pelo ombro,
fortemente.
-
Hey, você... – disse sentindo a voz falhar.
Os
olhos das duas se cruzaram. Mel com olhos vermelhos e mareados, a menina
com os olhos surpresos e assustados.
“-
Hey, Melzinha.- viu-a sorrir, colocando uma mecha dos cabelos claros pra
trás da orelha. – Por que está me olhando desse jeito? Até parece que não me
reconhece.
-
N...Não é nada, Iv. – disse olhando pra baixo. – É só que eu tive um
pressentimento estranho a seu respeito. Só isso.
-
Eu hein. Vira a boca pra lá! – riu baixo, envolvendo os ombros da amiga pelo
braço. – Vamos pro ginásio, temos que nos apressar. Hoje vamos ver os Eagles
detonando os Tigers da Drayton High School! – riu animada.”
-
Tudo bem, moça? – Lua perguntou sentindo o coração bater pequeno, ao ver a
garota vidrada.
-
Vamos embora, Luinha. – Rod disse apressado. – A aula já vai começar.
Precisamos achar a sua sala. – explicou-se.
-
Okay... – Lua examinou a menina novamente. – Está tudo bem com você?
-
E...Está sim. – Mel olhou-a, fazendo com que os olhos percorressem todo o
seu rosto.
-
Então está bom. – Luinha sorriu simpática. – Cuide-se, hein? – e continuou
seguindo seu caminho ao lado do primo.
- Melzinha!
– Chay disse chegando a seu lado. – O que deu em você?
-
Por um momento eu achei que fosse ela. – disse baixo, com o corpo ainda
mole.
-
Você sabe que isso não é possível, meu bem. – abraçou-a, afagando seus
cabelos.
-
Mas esse não é o mais estranho, Chay. – Mel disse estreitando os
olhos.
-
E o que é?
-
Acho que eu tive uma lembrança... – virou seu olhar pra ele. – Daquela
semana.
-
‘Vamos lá garota, está esquentando’. – Duan disse chegando ao lado
de Thur, cantando qualquer música do 50 cent que ouvia em seu iPod.
-
Bom dia. – disse sem olhá-lo.
-
Mau humor aqui é mato, hein?! Quê isso, dude. – tirou os fones do ouvido. – Ano
novo, vida nova.
-
Quem dera. – passou os olhos por todos os alunos, como se procurasse alguém.
-
Cara. – Duan disse segurando-lhe pelo ombro. Thur virou-se a contragosto
em sua direção. – Você sabe que é meu ‘irmão’ desde os doze anos, certo? –
consentiu. – Então escuta o conselho de um irmão, não de um amigo: Passa pra
frente. Esquece. É o melhor que você tem a fazer.
-
Eu não quero esquecer. – fechou os olhos, respirando fundo.
-
Você não tem que querer. Você precisa. Pelo bem do seu irmãozão aqui. – deu um
soco de leve em seu ombro, Thur sorriu torto. – Agora vamos pra sala,
margarida. Antes que a chata da Campbell nos coloque pra fora.
-
Turma B. – Rod disse olhando a placa em cima da porta de madeira. – É aqui
que nos despedimos, Luinha.
-
Tudo bem. Pode ir. – disse empolgada, passando os olhos pelos novos colegas que
estavam em pé ou sentados em cima das mesas. O primo continuou a olhá-la. – O
que é dessa vez, Rod?
-
Nada. Eu só... Estou preocupado. – passou dois dedos atrás da orelha.
-
Não precisa ficar. Eu sou grandinha, sei me cuidar. – deu de ombros. – Você
está me tratando como se eu tivesse cinco anos, molengo. Sabe que eu já passei
dessa idade há muito tempo. Eu sei lidar com uma nova escola. – rolou os olhos,
sorrindo.
-
Ok, ok, senhorita crescida. – disse entrando na brincadeira. –
Mas, Luinha, sério, qualquer coisa que precisar, o mica estuda na
sala ao lado, viu?
-
Está certo, Rod. Mas eu tenho certeza que eu não vou precisar de nada. Vou
ficar bem por aqui mesmo. - olhou o relógio de pulso. - Agora me deixe entrar,
senão vou ficar parecendo anti-social, ou algo do tipo.
- Cuide-se.
Alguns
minutos já tinham se passado desde que ela entrou na sala, e maioria dos
colegas já tinham olhado-a com uma cara estranha. Mas enfim, quem daquela
escola não tinha a olhado assim? Talvez fosse o jeito britânico de olhar uns
pros outros. Ou talvez fosse apenas o jeito britânico de olhar pros
estrangeiros. Mas, afinal, estava tão na cara que ela era latina? Acomodou-se
na cadeira, tirando da pasta verde um livro que tinha trazido pra ler, algum da
saga “Harry Potter”.
Chay
deixou Mel na porta da sua sala, dirigindo-se pra turma D. A menina passou
os olhos rapidamente pelas pessoas, focando na garota sentada no canto, lendo
um livro grosso. Sentia que precisava falar com ela.
-
Olá. – disse um pouco rouca. Lua virou seus olhos para encará-la.
-
Hey. É a menina do corredor, certo? – sorriu. – Já está melhor?
-
Bem melhor, obrigada. – sentou-se em uma cadeira do seu lado.
-
Desculpe a pergunta, mas... – fechou o livro. – Por que me puxou daquele jeito?
Confesso que eu assustei. – riu baixo, e Mel também.
-
Eu te confundi com outra pessoa. Desculpe-me, sério. – deu um tapa de leve em
sua cabeça. – Eu sou muito distraída.
-
Tudo bem. Já passei por isso. – fez careta. – Então, qual seu nome?
- Mel.
– estendeu a mão. – Pode me chamar de Melzinha. E você é a...?
- Luinha.
– apertou-a. – Lua, na verdade. Mas eu prefiro Luinha.
-
Quer dizer então que você gosta de Harry Potter? – apontou pro livro.
-
Que graça a vida teria sem a magia dos livros? – disse bem humorada.
O
horário já tinha começado há três minutos e ele ainda estava olhando-se no
espelho. Mais um ano. Droga.
Fez
com as mãos em formato de concha, enchendo-as com a água da torneira e passando
no seu rosto. Talvez aquilo aliviasse a tensão.
Thur
enxugou o rosto com um papel toalha, amassou-o e jogou no lixo logo em seguida.
Ser expulso da aula por chegar atrasado era uma péssima opção, ainda mais pra
quem queria se livrar das repreensões do pai. Arregaçou as mangas da camisa
social branca e dirigiu-se pra sala.
-
Desculpe o atraso, senhor Walker. – disse para o grisalho que estava na frente
da turma, fazendo com que todos os alunos o olhassem. O homem virou lentamente
seus olhos pra ele, irritando-se com a interrupção.
-
Sente-se, senhor Aguiar. – disse seco. O garoto obedeceu, sem manter
contato visual com nenhuma das pessoas da sala. Eram medíocres.
- Melzinha.
– Lua cutucou a menina que estava perdida em pensamentos. Mel virou
seu olhar pra ela, analisando-a: Estava eufórica e desconcertada ao mesmo
tempo. – Quem é ele? – cochichou baixo, olhando pro garoto que tinha acabado de
sentar perto da porta.
Mel
olhou-o de relance, sentindo o coração pulsar mais quente e engolindo a
seco.
-
Pra quê quer saber, Luinha? – cochichou de volta.
‘Pra
quê quer saber, Luinha?’ A garota também se perguntou. Tinha sido o primo
mesmo que pedira pra que se afastasse dele. Por quê? Talvez o garoto tenha
sacaneado Rod... Mas e se não fosse isso? E que coincidência encontrá-lo
na mesma escola. Destino? Quem sabe.
-
Curiosidade. – mordeu o lábio inferior.
-
O nome dele é Arthur Aguiar. Dezoito anos. Filho de um grande
empresário da Inglaterra. – encarava-a séria. – Se eu fosse você, ficava longe
dele.
Lua
endireitou a coluna, cruzando os braços em cima da mesa e voltando a prestar
atenção na aula. Sentiu um frio na boca do estômago, mas não havia de ser
nada.
Dois
horários depois, o sinal do intervalo tocou, fazendo com que todos os alunos da
turma B se levantassem.
-
Vai passar o intervalo com quem, Luinha? – Mel disse recolhendo seus livros
de cima da mesa, e dando uma olhada rápida em direção a porta. O garoto ainda
estava sentado, olhando fixamente pra uma caneta.
-
Provavelmente com o meu primo, Rod. E com o amigo feliz dele, mica. –
levantou-se, também olhando na mesma direção.
- Rodrigo Marques
e Micael Borges? – arqueou uma sobrancelha.
-
Conhece?
-
Claro. São melhores amigos de infância do meu namorado, Chay. – fez sinal
pra que elas fossem andando em direção ao fluxo, aproveitando que o rapaz
estava distraído.
-
Ah é? Você tem namorado?
-
Já temos dois anos de namoro. Às vezes eu acho que ele é o amor da minha vida.
– ficou mais rosada.
-
Que lindo.
-
E você, tem também? – começaram a caminhar atrás de Vincent, o maior garoto da
turma.
-
Tenho sim, no Brasil. – sentiu nervosismo ao ver que se aproximavam da porta, e
conseqüentemente, do garoto sentado na cadeira a sua frente. – Ele não
concordou com a minha vinda pra Inglaterra.
-
Eu também não concordaria se o Chay resolvesse morar do outro lado do
oceano.
-
Então eu acho que no final das contas, está tudo acabado entre nós. – suspirou,
sentindo os olhos ameaçarem a arder.
-
Você o amava? – Mel disse colocando uma mão no ombro da menina,
consolando-a.
-
Ele foi meu primeiro amor, mas não sei se ainda sinto a mesma coisa.
-
Amor é amor. Com menos intensidade, então não é. – piscou pra ela. Luinha
abriu um sorriso amarelo.
-
Obrigada. – quando terminou de pronunciar a palavra, Vincent já passava pela
porta, deixando as duas como sendo as próximas. Resolveu dar uma olhada
novamente no garoto que antes mexia na caneta.
Ele
estava parado com os cotovelos apoiados nos joelhos, e encarando-a fixamente,
com curiosidade. Seus olhos, quase sem brilho, representavam pra garota um
misto de mistério e perigo, tornando-o mais interessante que qualquer outro.
Seu coração descompassava, à medida que o largo momento se passava.
Thur
mantinha a garota em foco, enquanto tentava fazer sua respiração voltar ao
normal. Não era ela. Claro. Não podia ser. O que ele estava
pensando ao achar isso? Os cabelos dessa menina eram muito mais escuros, assim
como os olhos. Talvez sua pele fosse mais bronzeada também. Mas do que
importava? Se era tão diferente, porque ainda assim ele insistia em olhá-la?
Por que ela era tão intrigante? O que essa garota tinha que tanto o
perturbava?
Ela
também o olhava um pouco assustada. Ele não ligava.
-
Vamos, Lua. – a menina que a acompanhava disse rapidamente, incomodando-se
com a troca de olhar dos dois.
Espera.
Aquela não era... Mel?
- Sop,
espera! – mica gritou, vendo a garota dar passos largos no corredor,
provavelmente pra livrar-se dele. – Espera! – desviava dos outros alunos que
entravam em sua frente, continuando a segui-la.
-
O que você quer, Borges? – virou-se irritada. – Será que eu nunca vou poder
ter nenhum intervalo em paz?
-
Não até você acreditar em mim. – parou ofegante.
-
Já te dei duas chances de se explicar semestre passado. Você não conseguiu.
Agora me deixe em paz. – voltou a dar as costas.
-
Eu... – segurou seu braço. – Não tenho provas. Mas um dia eu terei.
-
Quando esse dia chegar, - ela disse por entre os dentes. – aí você me procura,
mas agora me deixa em paz, eu tenho namorado! – soltou-a, permitindo que ela
continuasse a se afastar apressadamente.
Ela
estava com outro cara, afinal.
- Luinha!
– ouviu o primo chamá-la com a boca cheia, assim que entrou no refeitório com a
nova amiga. – Aqui. – acenou de uma das mesas no centro, fazendo as duas se
aproximarem.
À
mesa, estavam sentados Rod – com a boca cheia de cachorro-quente
-, mica – um tanto cabisbaixo – e outro garoto, o qual ainda não tinha
sido apresentada.
-
Hey, amor. – Mel disse, sentando-se ao lado dele e dando-lhe um selinho
demorado. –Luinha, esse é o Chay, meu namorado.
-
Prazer, Lua. – estendeu a mão. O menino a olhou um pouco estático, assim
como todas as outras pessoas do colégio, depois apertou sua mão de leve. – Sou
prima do Rod.
- Chay,
namorado da Melzinha. Mas pode me chamar de Chay.
-
Alguém ficou sabendo do trote que passaram no senhor Walker? – mica
perguntou voltando a prestar atenção no local.
Londres;
Hyundai i30 prateado; Segunda-feira; 3:45 da tarde;
-
Eu gostei dela. – Mel disse encostando a cabeça no vidro.
-
Ela é simpática. – o namorado balançou os ombros.
-
Queria tê-la conhecido também. Essa garota. – Sophia comentou, no banco de
traz. – No mínimo é uma pessoa que me intriga. Por que ela apareceu agora?
Justo nessa escola?
-
Ela é brasileira, Sop. Tem bolsa de estudos. – a amiga explicou. – Não tem
culpa de estar aqui. Ela nem suspeita... – ajeitou-se no banco.
Londres;
Oxford Street; Segunda-feira; 3:57 da tarde;
“Fui
trabalhar. Quando voltar, quero saber tudo sobre o primeiro dia de aula na
Highgate. Tem comida congelada no freezer. Com amor, Papai/Tio John.”
-
Ele é uma peça. – Lua deu uma risada baixa, olhando o bilhete pregado na
geladeira.
-
É sim. – Rod a abria, tirando de lá uma caixinha de suco de laranja e
tomando-a no bico.
-
Ainda bem que eu não tomei esse suco. Teria um delicioso sabor azedo à
lá Rod. – revirou os olhos, o primo gargalhou.
-
Deixa de ser fresca, Luinha. – brincou. – Vamos pedir pizza? A comida
congelada do velho é horrorosa. E olha que eu sei do que estou falando. – pegou
o telefone branco sem fio e dirigiu-se pra sala, assim como ela.
Lua
jogou-se deitada no sofá azul macio, enquanto Rod sentava-se no
outro.
-
Ah sim, uma gigante, meio calabresa e meio pepperoni. – concordou com a cabeça.
– Já sabe o endereço? Ah sim. Obrigado.
- Rod?
– ela perguntou, focando o teto.
-
Diga, baixinha. – desligou o telefone.
-
O que aconteceu entre o mica e aquela garota? – disse simplesmente,
fazendo-o arquear as sobrancelhas.
-
Gostei. Observadora. – balançou os ombros.
-
Mais do que você imagina. – tentou disfarçar sua curiosidade maior.
-
Eles namoraram, um tempo. Aconteceu um mal entendido, eles terminaram. – roeu a
unha do dedo médio, como se estivesse desinteressado. – Como qualquer casal
normal.
-
Que mal entendido?
-
Pergunta isso pro mica, Luinha. Detesto ficar fazendo fofoca. – ligou
a televisão no canal de ‘Friend’s’.
-
Ah, claro. “mica, por que mesmo você foi chutado?” – disse com uma voz afetada,
fazendo o primo rir baixo.
-
Então pergunta pra ela.
-
“Olá menina que eu não conheço, o que o mica fez de tão grave?” – Rod
riu mais ainda.
-
Ok, Luinha. Péssima.
-
Culpa sua. – sorriu, vendo Chandler fazer caretas na televisão.
Londres;
Dockland; Segunda-feira; 4:14 da tarde;
Sentou-se
na cama, passando a mão direita na cabeça do cachorro, ali deitado. Observou
novamente seu apartamento: Muito diferente do que estava acostumado. Apesar de
ter uma grande vidraça pra cidade de Londres, já que morava na cobertura, era
constituída apenas por uma sala grande – onde montara a sua cama de casal, uma
cozinha, e uma sala de estar improvisada – e um banheiro. Era suficiente pra
ele e pro cachorro Golden Retriever, apesar de que esse insistisse todos os
dias para dar uma volta.
-
Não era ela, garotão. – esfregou-lhe a cabeça. O cachorro olhou-o sem entender.
– E agora mais essa. Aposto que apareceu só pra infernizar a minha vida... Só
pra me perturbar.
Londres;
Highgate High School; Terça-feira; 3:30 da tarde;
-
Precisamos resolver isso. A situação não pode continuar como está. – o
professor de física manifestou-se, passando as mãos pelos cabelos ralos.
-
De quem foi a brilhante idéia de colocá-los na mesma sala? – foi a vez do
professor de cálculos.
-
Os alunos são divididos por suas médias, senhor Johnson, de forma que todas as
salas fiquem equilibradas. A garota é brasileira, não tinha como ninguém saber.
– senhora Paskin bateu os dedos freneticamente na mesa da sala de
reuniões.
-
Não importa quem foi o culpado. O mais viável é que fiquem em salas separadas.
Para o bem de todos.
-
Não podemos afirmar que ele tenha sido o culpado. – professor de biologia. –
Pode ter sido qualquer um. Ela correria risco em qualquer sala. Além do mais,
uma pessoa já não foi presa por causa disso?
-
Sim. Mas ninguém acreditou na culpa dela, Willer.
-
Ninguém garante que a história vá se repetir. É até uma suposição tola.
-
De qualquer forma, eu não quero aquela menina lá. Não naquela sala. Não junto
com ele. – novamente o professor de cálculos se manifestou.
-
Ele não foi o culpado. – senhora Paskin disse com convicção. – E eu me recuso a
trocá-la.
-
A senhora não pode provar.
-
Mas eu tenho certeza. – ‘E vou prová-los’, pensou.
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Creditos::A Lan,e adaptado por Brubs Barros de "Um Amor de Novela"
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